Wednesday, March 31, 2010

Sim, eu sei

Eu entendo

Essa dor que confunde

Que estilhaça por dentro



Parece um sentir sem sentido

Um abismo que acena

Para a queda



Eu sei,

Custa muito

Lidar com feridas

Tão grandes

Que parece que

Somos ferida

Que somos dor



Sim, eu sei

Que por doer tanto

Apetece fugir

Saltar para longe

De quem somos



Eu entendo

Custa muito

E parece que

Todos os abraços

Do mundo

Não chegam



Para limpar as lágrimas

Do fundo secreto de nós mesmos



Nesse centro do labirinto

Onde estão as feras

Que temos medo que nos devorem



Eu sei, porque aí estive

E a dançar, no terreiro do amor

Fui descobrindo o caminho de volta

Para o céu dos abraços

Para a paisagem dos encontros

E dos olhares de cura



Vem

Dança connosco

Deixa-nos abraçar-te

Deixa-nos olhar-te

Dizer-te que tudo está bem

Que tudo está certo



O abismo não é abismo

É a antecâmera do voo

Nas asas douradas do amor



E as feras, depois de olhadas

São apenas sombras à procura da luz

Trá-las para dançar também




E deixa encantarmo-nos

Com a beleza do teu ser.

Wednesday, March 17, 2010

Ser
Como quem tenta
Agarrar o nevoeiro

Gestos desertos
No corpo engrenagem
Sentir á margem

Semântica anestesista
Que derrota pela conquista
Sorrisos uniforme em tons néon

A vida a meia haste
Não há que chegue
Não há que baste

Penumbra intermitente
Viver sozinho no meio da gente.

Friday, March 12, 2010

Alguém

(Que pensa nestas coisas)

Disse

E eu ouvi

Que este universo

Não é isso

Universo

É apenas mais

Um

Verso

Do Multiverso



Disse

Que múltiplos cosmos

Flutuam

Como bolas de sabão

Na imensidão

Da não existência



Como berlindes

Nas mãos de miúdos

Que faltaram à escola

Ou bolas de naftalina

Que caíram do saco



Eu, que fiquei a pensar nisso

Porque alguém

(que estuda estas coisas)

O disse e eu ouvi



Pensei

Que raio é que interessa

O que penso sobre isso

Ou sobre quem pensa em pensar nisso

Já que pensava na minha

Pequenez de pensar

Em frente de algo tão grande

Que pensar ou não pensar

É o mesmo que o inverso

E tanto faz se lembro ou esqueço

De esquecer ou de lembrar



Apre! Tropecei no passeio

Perdi-me em desequilíbrio

No susto de ir ao chão



Lá se foi a cosmologia

A coxear pela rua abaixo.

Thursday, March 11, 2010

Aquele momento
Aquele momento
Infinitamente pequeno
Tão pequeno
Que o tempo já não se é
Fica a olhar para si
Eterno
Tão grande
Por ser tão infinitesimal

Sim, esse momento
Antes
Mesmo antes
Exactamente antes
De levar um murro na cara

Instante relâmpago
Dimensão outra
Tempo outro
De um universo contido
Colapsado
Num punho

Toda a existência
Concentrada
Focada
Situada
Num objecto de carne
E ossos

Naquele instante
Muito menos que instante
Tão pequeno que teríamos
De inventar
Uma nova palavra
Se o quiséssemos dizer

Nesse não instante
Nesse não momento
Sim, esse mesmo

O corpo ruge
Rebenta
Sem som
Na erupção
Violenta
Da sua animalidade

Toda a história
Cósmica
Evolutiva
Filogénica

Explode
Estilhaça os diques
Os limites

Da normalidade
Neo cortical
Verbal
Individual
Para ser
Animal

Esse momento
Infinito
Parado
Em movimento

Mesmo antes
Exactamente antes
De levar um murro na cara

Rasga qualquer filosofia
Oblitera toda a crença
Remorso ou esperança

Todo o ser
Resumido
Ao antecipar do embate

Na inevitabilidade
Suprema
Absoluta
Abrupta

Do instante
Sim, esse
Esse mesmo
Exactamente antes
De levar um murro na cara

Tuesday, March 9, 2010

Viste o céu?
Sei lá
A noite
Já não é minha

E a ternura?
Murchou
Talvez
De se ter cansado

Já não voltas?
No sonho
Talvez na cantiga
Ou na chuva sobre a pele

Porquê?
A vida é dona dela
E o rio não pede desculpa
Por ter como destino o mar.