Sunday, November 22, 2009

A menina Pinóquio

Feita de carne e vontade

Aprendeu o que é próprio

A uma menina da sua idade



Para agradar ao carpinteiro

Senhor do bom e do mau

Anulou-se por inteiro

Tornou-se menina de pau



Agora fios invisíveis

Estão a guiar-lhe os gestos

E dos mundos possíveis

Só lhe sobraram os restos



Não suporta a verdade

Nem a vida que é acesa

Vive-se pela metade

E precisa de certeza



Defende de queixo erguido

O senhor que a manobra

Que lhe criou o sentido

Na tentação da cobra



Ai que o prazer é maldito

O sacrifício é que eleva

O sentir é proscrito

E da luz fez-se treva.

Wednesday, November 4, 2009

Que a dor de ser
Não me faça
Um ser de dor
E que beber
Da rubra taça
Me traga o amor.

Nas galés da produção
Ao som do chicote sucesso
Congela-se o coração
Não se lhe pode dar preço

Ecoa o tambor da escassez
Ainda falta o que satisfaça
Nunca chega o que se fez
E a fome que não passa

Mantêm o desejo nos curros
Conforto de não ousar
Minguam o touros a burros
E alegram-se a comprar.

Thursday, October 29, 2009

Primeira Dança

Recordo-me de estar contigo
Algures em mim
No abrir de olhos da madrugada
No rio que trouxe a descoberta

Estive contigo
Tenho a certeza que sim
A minha pele recorda quem tu és

Corremos juntos, talvez
À sombra da grande montanha
Que segura o céu

Conquistámos a beleza
Criámos a verdade de estarmos vivos
No embalo da nossa dança

Já cá estiveste
No meu sorriso arco-íris
Encantamento que cá deixaste

Olha-me, agora
Lembras-te de mim?
Sou aquele que por te recordar
Te ama sem te conhecer.

Wednesday, August 26, 2009

Uma gota de Universo
Caiu-me na renúncia
Á esperança

O sonho duplicou-se
De ambrósia
E o amor tornou-se rei.

Marcar a folha
Com a marca da palavra
Para haver mais
Para ser mais

E com a marca da palavra
Entrar dentro do corpo
De quem lê
Através dos olhos
E pela voz que lê
Dentro

A palavra
Feita de pontos e linhas
E sons dentro da cabeça
Que por um código
Que existe
Apenas porque sim
Evoca
Invoca
Sensações
Imagens
Memórias
Significados

Esta palavra
Aqui escrita
E lida
Agora
Deixará de ser palavra
Quando não estiver ninguém
A lê-la

Nesse momento
Já não é palavra
Será apenas pontos e linhas

Ou já será coisa nenhuma
Porque não haverá alguém
Que veja e sinta
Que é alguma coisa

Assim, esta palavra
Daqui a pouco
Já não será.

Liberdade
Escusa
Esquina
Difusa
Reserva de sonho
Recusa

Centro
Invisível
Ser o
Possível
Sondar a presença
Desnível

Religião
Certeza
Vida
Represa
Perder a conquista
Torpeza

Palavra
Verso
Ser o
Inverso
Escrever a impulso
Imerso

Gestos fragmento
De sentir disperso.

Monday, August 24, 2009

Raiar penumbra
No recôndito espaço
Solene
Da solidão

Pátria sanguínea
Recobro da ternura
Deslumbramento

Luz confessa
Regressada à noite
Após a batalha
De ser gente

Ser vítima
È o estatuto
Dos esquecidos
De si.

Thursday, August 20, 2009

Dizem
Ao homem
Pequeno
Que é livre

E ele acredita
Até houve
Uma revolução
Para o libertar

E assim
Ele
Livremente
Escolhe
A servidão.

Corpo
Preso
Á máquina
Estilizada
Esterilizada
Brilhante
Cortante
Que o alimenta
Fragmenta
Dormenta
Automatiza
Des-somatiza
E o corpo
Autoriza.

Todo o homem
Nasce
De mulher

No caminho
Para ser
Homem

Tem de separar-se
Largar
A casa
Do feminino

E voltar
Quando quiser
Tornar-se Pessoa.

Sunday, August 16, 2009

A procura de sentido
Esgota-se no sentido
Da procura

Procurar o sentido
Separa o sentido
Do sentir

Sentir o sentir
Sem procurar
O sentido

Dá sentido ao sentir
Sem sentido encontrar
Por sentir se bastar.

Thursday, August 13, 2009

Para a vastidão cósmica
Uma galáxia é mais pequena
Que um átomo para um homem

O universo fica impassível
Infinitamente indiferente
À morte de um homem

Mas quando morre
Um homem
Morre um universo.

Antes do princípio
De tudo
Não havia antes
Nem tudo
Nem havia não haver

Havia nada
Que não havia
Porque para haver
Nada
Teria de haver
E nada havia

Antes do princípio
Não havia fim
Porque não havia
Que fosse
E acabasse

Antes do princípio
Não havia
Quem pensasse
No que havia
Antes de haver pensar
E antes de haver que houvesse
Que desse que pensar.

Wednesday, August 12, 2009

Vento descalço
Delírio
Ombreira das sombras

Chuva imóvel
Cigarro
Cheiro de vidas opacas

Cristal difuso
Presente
Função de estar sozinho

Intenção reclusa
Desnorte
Rua sem regresso

Corpo escancarado
Fuga
Venda em que se perde

Olhar remoto
Ausência
Velho em tom criança.

Tuesday, August 11, 2009

A António Sarpe, mestre e amigo.

Suave como amanhecer
Desliza na força do corpo Mundo
Enraizado no coração

Alegria primavera
Ave do paraíso
Lançando a semente dourada

Abraços universais
Criam constelações de ser feliz
No ninho branco da esperança

Deus que é mais deus
Por ser o berço de deuses
No fulgor da doçura encantada

Palavra, carne e sangue fortaleza
Prazer de ter prazer no mar de ser grande
Cores da renascença da vida

Conquistaste esta praia com a nau do teu sorriso
Desfraldando o padrão da liberdade
E nós que te bebemos, encontrámos o tesouro.

Larga o riso, João
Senta-te à mesa direito
Com o peso do olhar que te põe freio

Sabes, João
Querer ser mais faz mal
Sonhar tira o pão da mesa

Pois é, João
Eu também nunca fiz o que quis
Temos de fazer sacrifícios para sermos alguém

Se eu me sinto alguém?
Não faças perguntas parvas
E come a sopa!

Diáspora inerte
Respiração nocturna
Fragmentos de sentir peremptório
Império ajoelhado a si mesmo

Realidades metafóricas equilibram-se
Na tristeza emprestada

Dormir é o desejo
De quem marcha em seu redor
Buscando a nota certa
Que alivie o acordar.

O ser deixou de só ser
Quando passou a existir
Olhou-se no espanto de si
Começando a reflectir

Ser só ser já não chegava
Precisava de sentido
“Se existo é para quê?”
Queria sentir-se cumprido

Ao descobrir-se mortal
Criou deuses eternos
Negou a vida acabar
Vieram céus e infernos

Para livrar-se do medo
Colou ordem ao caos
Tornou o mito em lei
Selando os bons e os maus

O medo que não acaba
Demarcou-se a terra
Sobre muros e estandartes
Começou-se a guerra

De tanto querer existir
Deu cabo da existência
Reaprender a só ser
Impõe-se a nova ciência

Bastar-se no que se é
Na luz de cada olhar
Em que tudo é perfeito
Por apenas ali estar.

Friday, August 7, 2009

Para os seres que são
E pensam no que é ser
Não ser é uma intrusão
Que não podem conceber

Só se conheceram sendo
Não sendo não se conheciam
Paradoxo tremendo
E do facto desconfiam

Não pode a morte ser morte
Traria o fim infinito
E num golpe de sorte
São salvos pelo mito

Já não morrem afinal
Porque matam o não ser
Acontece a vida total
Só depois de morrer.

Wednesday, August 5, 2009

“O que hei de fazer?”
Resigna-se o explorado
Desnutrido do poder
Que lhe mudaria o fado

Uma mão invisível
Pesada como aço
Limita-lhe o possível
Sustenta-lhe o cansaço

“Temos de produzir
Dar lucro ao país”
Repete a sorrir
Levantando o nariz

Orgulho de cego
Na sua falta de luz
Martelando no prego
Que o prende à cruz

A dominação é completa
Quando o dominado
Aceita como certa
A lógica do seu estado.

Thursday, July 2, 2009

A cadela entrou na igreja
E urinou no altar
Na sua voz que troveja
Correu o padre a gritar

Ai, tinhosa que te esgano
Candelabro como clava
Persegue o bicho profano
Que de medo se raspava

Arremesso bem medido
Da lança improvisada
Coxeio e ganido
Da fêmea escanzelada

Vá de retro saco de pulgas
Uivou alto o guardião
Quem é que tu te julgas
Digna de salvação?

Ficou feliz o sacerdote
Do seu acto sacrossanto
Ajeitando o seu capote
Como de rei fosse o manto

É tão bom ser dos bons
Ser um porteiro do céu
Concentrar em si os dons
E saber para cá do véu

E eu que sou ignorante
E percebo pouco de fés
Ficaria radiante
Se o bicho lhe mijasse nos pés.

Tuesday, June 30, 2009

Corpo de Mar

Deusa descalça

Celebra a dançar

O sonho de amar

Que o gesto realça



Sorriso estandarte

Do reino carícia

Que leva a amar-te

Só por olhar-te

Serena delícia



Danças a vida

E a vida te dança

Em cor divertida

Por ser tão vivida

No teu riso criança



O Universo conspira

Juntou-nos enfim

E este poema respira

Esta Deusa que inspira

A vida em mim.

Wednesday, June 24, 2009

Pulsar

A noite espessa e antiga escorre sangue virgem
Retorno alucinado nos uivos das bacantes

A lua reina metáfora de si mesma
Explodindo nas sombras e nos olhares de vida abrupta

A fêmea resfolega de insaciedade no centro dos sexos que se mergulham
Fúria acesa de imortalidade, rasgar de carnes e fronteiras

O deus renascido emerge dos corpos diluídos
A dança ferve-se e tolda-se orgásmica e soluçante
Paroxismo tremente dos perdidos

O vórtice enraíza-se no seu útero de seiva renovada
Fecundando a terra aberta e receptiva
Que da morte necessária faz emergir a vida

Na curva que recria o início
As dançarinas despejam-se esgotadas no torpor de sexo sanguíneo
Deixando-se no sono inerte dos vencidos

O silêncio primordial ecoa e dissolve as formas
Corpos universo em sentir de éden amniótico
Só Um em êxtase de si mesmo

Novo cosmos
Novo tempo
Natureza reiniciada

Pulsa o ritmo do retorno
No limiar da luz

Imagina-se a manhã no fresco que ensopa a pele

Regresso
Encontro do outro em si
E de si no outro

Abrem-se os olhares
Chegou o Sol, a palavra, a regra.

Wednesday, June 3, 2009

A promessa da vida depois da vida criou o desprezo pela vida
É a vida de um “santo” mais santa do que a de uma criança a morrer de fome?
A vida é os seres que a vivem!

Enfiem Platão dentro da caverna a que nos condenou.

Wednesday, May 27, 2009

DEMÉTER E DIONÍSIO

Estou bêbado de ser
Mergulhado na ambrósia do encontro

Toda a vida é uma vida
Todo o corpo é um corpo
E a música enraíza-me em ti

Partilhamos pão e vinho
Casa e mundo
Divino e humanidade

Viço de corpos semente
Gestos colheitas
Ritmos da criação

Esta dança de fogo sagrado
É um casamento divino
Dura este momento fugaz
Mas é um mistério eterno
Que dura um mundo inteiro

Porque os deuses dão-se vida
Nos suspiros da nossa entrega.

CANÇÃO DE EMBALAR

Pequenino
Pequeno funcionário
Tudo encolhes
Nas contas do teu rosário

Tuas certezas
E pompas arrogantes
Misérias convictas
Do céu dos ignorantes

Pequenino
Pequeno ditador
Apodreces
Os frutos do amor

São teus filhos
Coisas sem vontade
A tua sombra
Esmaga a liberdade

Pequenino
Pequeno moralista
Dás morte ao sonho
Desprezas a conquista

Vê se dormes
Para te calares
Um bom soninho
Sem nos chateares.

Wednesday, May 13, 2009

Minotauro

Ariadne
Dá-me a segurança da tua espera
Repousa-me com a tua guia luzente
Que vou lançar-me neste útero
Labirinto pulsante e irrigado de desejo

Está em mim o Mito
A renúncia de quem avança

Vou perder-me
Tenho de perder-me
Se quero receber-me em glória

Mantém-me ligado ao fora
Ao terreiro dos olhares
Que lá dentro estou comigo sem mim

Senta-te e espera-me
Com o teu vaso de água fresca
E o cesto de romãs
Que eu já venho

Vou salvar o Minotauro
Libertá-lo da vergonha que o prendeu aqui

O resgate do seu poder
Será a salvação do nosso reino, Ariadne

Os deuses serão mais homens
E os homens serão mais deuses

E deusas, Ariadne

Espera-me, meu amor sereno
Que eu vou libertar a vida
Lá longe

Sem sair do teu colo.

Fundo do Poço

Na queda olhava o fundo

Tentando antecipar o dano

Do embate todo humano

De quem lhe dói o mundo


E por olhar para o fundo

Nem sonho de luz via

O negrume não alumia

No seu abraço rotundo


Precisou bater no fundo

Sofrer a dor do embate

Desamparo sem resgate

Ricochete imundo


Para a queda ser parada

Que todo o ser lhe doa

Neste fundo de ser pessoa

Mentira derrotada


O fundo também é chão

Sustenta o levantar

E agora já pode o olhar

Erguer-se em elevação


E é no escuro menos dia

Abismo que tudo reduz

Que consegue ver a luz

Que a cair não via.

Tuesday, April 28, 2009

Antes do nada
Recuperar a semente
Nocturna
No frio da certeza

Umbigo terreno
Sobre a sombra vasta
Pegadas de água
No princípio

Ir à fonte
Ir ao centro
Que é agora
Cutelo da pergunta

Recordação
Eco de sentir
Névoa de batalha
Ruído da bonança

As palavras já não marcam
E o sonho já não vence
Porque a vitória agora é do corpo
E tudo é natural como o amor.

Wednesday, April 1, 2009

Cama desfeita sobre o mar, enraizada no solstício do ser
Poalha de gestos inacabados, sussurros inertes de desaprender
Braços sonho, sorrisos verbo, constelação de sonhos refeitos
Brisa que dança descalça no limite dos corpos eleitos

Soberana fonte invertida, no arco primal do templo
Quadro que se pinta a si mesmo na certeza do exemplo
O tempo parou a olhar-se, na elipse da pele sem segredo
Erigiu o padrão nesta praia, onde o amor venceu o medo.

Saturday, March 28, 2009

Tango

Geme a noite
Ardente
Chama de sangue
Em gente

Corpos juntos
Num beijo
Olhos flecha
Desejo

A música chora
Segredo
Passo que rasga
O degredo

Luta e conquista
Abraço
Morder em gesto
O espaço

Feroz doçura
Entrega
Mão na cintura
Refrega

O fim a noite
Que o traga
Que o tango começa
Só quando acaba.

Monday, March 16, 2009

Mantenham os deuses na terra
Aqui, onde a vida se cria a si mesma
Como ímpeto irreprimível

Matem os deuses sem corpo
Que têm medo do prazer
E dominam pelo prazer na dor

Esqueçam os deuses infantis
Que de tão pequenos precisam de adoração
Para se sentirem grandes

E vingam-se de quem se liberta
De quem assume o seu poder criador
Com eternidades de danação

Invoquem os deuses que dançam
Que riem e que bebem
Se deleitam na vida

Os deuses que nutrem do seus seios
Procriam pelo orgasmo
E celebram a grandeza das criaturas

Porque a Criação é o Deus de si mesma
A vida adora-se na sua exuberância
No ser só sendo apenas para ser.

Thursday, March 12, 2009

Versos Inacabados

Solitário viajante
Acolhido de passagem
Em vidas estrangeiras
Regido pelas despedidas

Todas as partidas
São regressos
À sua natureza
De órfão perene

O aconchego do hábito
Mantém-no quente
No frio das terras ermas
E no silêncio da noite

Nunca chegará ao destino
Porque cada chegada
È um novo começo de estrada
E parar é sentir

Palavras do Mundo Novo

Sar précisaer
Novais palevraeis
Pareis criaser
Onia novrael
Mundral
Ondias or amorfelizar
Serflorer ol crestrela
Librardeluz ol naturfestir
Cimer ror Solcolorir
Dior mafresca diar Verarlelicitar.

"São precisas
Novas palavras
Para criar
Um novo
Mundo
Onde o amor
Seja e cresça
Livre e natural
Como o Sol
Numa manhã de verão"

Novas palavras para o amor

Sar précisaer
Novais palevraeis
Pareis criaser
Onia novrael
Mundral
Ondias or amorfelizar
Serflorer ol crestrela
Librardeluz ol naturfestir
Cimer ror Solcolorir
Dior mafresca diar Verarlelicitar.

"São precisas
Novas palavras
Para criar
Um novo
Mundo
Onde o amor
Seja e cresça
Livre e natural
Como o Sol
Numa manhã de verão"

Tuesday, March 10, 2009

Movimento lento de eternidade
A música sou eu
A dança é o Universo

Fundido no êxtase de estar vivo
Na vida dos outros
Na vida da vida

Carne, sangue e silêncio
Retorno ao grande mar
Onde tudo começou

Vive em mim o princípio
Agora, neste enlevo de transe
Sopro divino que me move

Nasço agora que danço
E com olhos recém nascidos
Celebro a vida que é vida em mim.

Praia inquieta
Pegadas levadas na onda

Nada fica
Tudo é sendo

Como o Sol que me queima
Já foi
E não é
O que me queima agora

Tudo é
Por haver o que não seja
È em frente ao não ser
Que o ser se é

Como a praia
Que só é
Por não ser mar
E o céu
Por não ser terra

Mas tudo deve ser
Mesmo que não seja

Porque nesta praia de luz
Deixo-me ser

Com os pés frios de água
E a cara quente de Sol

Não sendo
Também sou mar
Também sou céu
Também sou praia.

Emerge o ser que sou
No espaço entre mim
E o olhar do outro

Epifania
De mim
No nós

Cresço-me
Pelos olhares
Que me amam

Amo olhar
Quem eu amo.

Gestos prévios
Corpo ampliado

Corpo sem corpo
De ter o Universo
Como corpo

Ser antes
De vir a ser

Flutuar
No vazio
Que é tudo

Respirar
Eternidade

Sonhar galáxias
Parir os mundos
Mãe e Pai do infinito

De cada ser
Ser o ser

Imperativo da vida
No fogo das estrelas
Nas asas da borboleta

No suspiro do teu amor.

Thursday, February 12, 2009

A minha chuva cai em ti
Troar cósmico de Úrano
Na dança criadora de mundos

No Centro do vulcão do teu ventre, Minha Gaia
Afunda-se o Áxis Mundi fervente
Que trás novos começos

Abre-se um universo de universos
Galáxias de vida emergente
Descem para ti em rio de luz eterna

Tu, Mãe, acolhes os novos mundos no teu seio
Deuses de vir a ser que te mergulham
Na fome infinita da criação

O Ser torna-se carne pelo nosso desejo
O Amor pode viver-se na nossa seiva
Explodindo num tremendum de flores vida

Dançamos desde de antes do tempo, Deusa
Eu que te crio por te deixar criares-me
Deus Céu que só existe na tua Terra

Nasceu o Filho do Homem que tu alimentas com o teu sangue
Brotou o Príncipe dos Príncipes inteiro e já com reino
Da suavidade da tua imensidão serena

Neste abraço do começo da vida
Deixamo-nos dormir na imobilidade da perfeição
Que se move no rugir dos nossos corpos

Amo-te, Deusa das primaveras, por receberes o meu fruto dourado
E solto-me no meu descanso divino de quem acabou de criar o Mundo.

Wednesday, February 4, 2009

Os ignorantes
Que não sabem
Que não sabem
Julgam que sabem
E dizem-no de boca
E peito cheios
Como se a suas
Verdadezinhas
De zé ninguém
Fossem a doutrina
O livrinho vermelho
O evangelho de absoluto

Os ignorantes
Por não saberem
Julgam que sabem
E que sabem mais
Do que os outros
E até acham que sabem
Como os outros
Deviam de ser
E fazer

Os ignorantes
Por não saberem
Que não sabem
Acham que o mundo
Seria melhor
Se fossem eles
A mandar
O Universo
Seria perfeito
E criaram os deuses
Ás suas imagens

Porque eles
Pensam que sabem
Sem saber
Que não sabem
As suas verdadezinhas
São isso mesmo
Inhas
São a parte que lhes cabe
Da percepção do mundo

Os ignorantes
Por acharem que sabem
Não levantam os olhos
Dos seus umbigos
Não vêem mais alto
Que a sua pequenez

Os ignorantes
Por não saberem
Que não sabem
Mandam
E querem mandar
Precisam disso
De meter o mundo
Num torno
Para tornar verdade
A mentira da sua ignorância

È por isso que os ignorantes
São os pais e as mães
De todas as ditaduras.

Muitos pais
Não são
Os degraus
Que ajudam
A elevar
Os filhos
São as solas
Dos sapatos
Que os espezinham.

Sunday, January 11, 2009

Nu
Despido de toda a História
Entrego-me ao teu olhar

Flameja em mim
O corpo sagrado
Que tu envolves
Na túnica rubi dos teus beijos

Solta-se de mim a lágrima esquecida
Faminta
Selo da memória
De todos os desertos gelados
E das guerras perdidas

Deixo-me
Entorno-me no teu peito
Afundo-me na confiança da tua presença

Saboreio o teu saboreio de mim
Pingos de eternidade no meu corpo
Reflexos de céu sobre a pele

Largo-me de mim
Para ser eu
Nós

Cai por mim um soluço eterno
Alívio por retornar a casa
Onde nunca vivi
Mas aonde sempre quis regressar

Sonhei com este momento tantas vezes
Tantas vezes
A esperança de o ter foi o meu farol
A estrela polar das minhas viagens

Quero chorar

Chorar agora é a minha vitória
Cheguei e agora posso chorar

Embala-me no teu amor
Cura-me com o teu olhar
Ajuda a pôr de pé outra vez
Este anjo caído do alto de si

Agora sim
Sou amado, logo existo.